Janaína Oliveira é pesquisadora e professora da Universidade Federal de Juiz de Fora, mesma cidade em que nasceu. Viveu sua infância no Bairro Boa Vista, onde descobriu a paixão pelos estudos, que, mais tarde, a levou a cursar engenharia elétrica. Com uma trajetória de mais de 16 anos dedicada à pesquisa, Janaína acredita que a ciência precisa ir ao encontro de outras mulheres, por meio de iniciativas que vão para além do campus da universidade. Quando retornou do doutorado na Suécia decidiu colocar isso em prática. Pensando em contribuir para a equidade de gênero no campo científico e na engenharia, Janaína, ao lado de outras estudantes, fundou, em 2004, o primeiro grupo IEEE Women In Engineering do Brasil. O projeto pertence a um grupo internacional, presente em mais de cem países do mundo, e, em Juiz de Fora, as atividades buscam incentivar tanto as estudantes do curso de engenharia, quanto garotas de escolas públicas a serem cientistas.
Da janela de madeira entra a luz que ilumina a estante coberta por livros de todos os tipos, cores e volumes. Sentada à frente do móvel, a professora e pesquisadora da Universidade Federal de Juiz de Fora, Janaína Oliveira, 38 anos, relembra o caminho que percorreu. Quando ainda criança se encantou pelos estudos, especialmente por números, fórmulas e sistemas, a ponto de crescer e se tornar uma cientista que pesquisa a energia. Mas parecia tão distante aquele caminho até a universidade… E o que a motivou e mostrou que era possível ocupar esses lugares foi ver outras mulheres ali. A curiosidade da infância se transformou em ciência e, hoje, Janaína desenvolve projetos em Juiz de Fora para que mais mulheres possam ver nas áreas de ciência e tecnologia um futuro.
Janaína hoje é professora do Departamento de Energia da Faculdade de Engenharia Elétrica da UFJF. Ao todo, as disciplinas profissionalizantes do curso de engenharia elétrica, que envolvem os departamentos de Circuitos Elétricos e Energia Elétrica, contam com 56 professores, destes apenas três são mulheres.
“Eu me lembro que na faculdade eu gostava muito das professoras do departamento de física, que era onde tinham mulheres, e falava que queria ser igual a essas professoras. Hoje em dia, minhas alunas me falam: ‘é tão bom ter aula com você, porque faz parecer que eu posso ser assim’. É representatividade, você se vê no lugar daquela pessoa”, afirma Janaína.
Seria o habitual, talvez até mais cômodo, focar nas suas pesquisas sem se preocupar em inserir, na prática, as pessoas que não fazem parte da comunidade científica, mas não foi por esse caminho que Janaína decidiu seguir. Em 2004, a pesquisadora foi uma das fundadoras do primeiro IEEE Women In Engineering do Brasil, o IEEE WIE UFJF, um grupo de afinidade estudantil do Institute of Electrical and Electronics Engineers (IEEE), que promove iniciativas para combater a desigualdade de gênero no campo científico e na engenharia. Desde 2014, quando retornou à UFJF como professora, coordena o projeto que, atualmente, conta com cerca de 20 membros.
Janaína ressalta o compromisso do grupo de alcançar as escolas públicas de Juiz de Fora. “São essas crianças que precisam ver ou ouvir que engenharia é coisa de menina, que ciência é coisa de menina. Os projetos de extensão que eu trabalhei tentam buscar a população que não recebe essa informação todo dia.”
Antes da pandemia, o WIE elaborou um projeto junto com a Casa da Mulher, oferecendo cursos para a formação de mulheres visando à emancipação. Os conteúdos eram variados e ensinavam desde trocar resistência do chuveiro até entender como funciona a conta de luz.
“Muitas vezes, a mulher que sofreu uma violência depende do homem para essas coisas. Era um projeto que eu achava tão lindo de discutir esses assuntos técnicos com mulheres, principalmente mulheres que estão em uma situação de sensibilidade, dar a elas essa sensação de ‘eu posso resolver isso, não preciso de chamar um homem para vir aqui fazer isso para mim.'”
Para Janaína, o projeto funciona como um espaço de encontro com outras mulheres que também querem ajudar mais pessoas, e é essa dinâmica que, além de trazer força, a motiva. “O WIE é o lugar onde eu consigo trazer as questões de ser mulher, de incentivar e compartilhar o ser mulher, principalmente no espaço de minoria.”
"Que a gente não precise ir lá dizer que lugar de mulher é onde ela quiser, que seja natural, que a minha filha cresça com isso natural e saiba que ela pode fazer o que ela quiser. Quero que a minha filha me veja voltando a fazer o que eu amo e que isso seja para ela e para tantas outras meninas uma forma de entender, muito natural, de que a gente faz tudo. Inclusive para os meninos também que fique muito claro que as meninas podem fazer o que elas quiserem"
A mãe de Janaína, Maria Helena Gonçalves, era tecelã, e seu pai, José Maria Oliveira, marcador de água. A pesquisadora foi a primeira da família a ingressar em uma universidade. Na turma de 2002 do curso de engenharia elétrica, estudavam Janaína e mais cinco garotas em uma sala com 30 pessoas.
Desde o segundo período da faculdade, ela começou a participar de projetos de iniciação científica, mas foi no sexto período que decidiu seguir nessa área, após ser uma das dez pessoas selecionadas na América Latina para fazer um estágio em Campinas, no laboratório do Centro Nacional de Pesquisa de Energia e Materiais (CNPEM), onde fica o Sirius – maior fonte de luz síncrotron (radiação eletromagnética que pode ser usada para a observação das estruturas internas dos materiais, como átomos e ligações químicas) do Hemisfério Sul.
Ao concluir a graduação, deu início ao doutorado na Suécia, onde morou por cinco anos. Antes de retornar à UFJF, trabalhou como pesquisadora da multinacional General Electric, no Rio de Janeiro. “Eu sou muito acadêmica, por isso, sentia muita falta da sala de aula, eu amo a universidade. Então decidi ir para a UFJF porque achava que podia fazer diferença no ambiente e acreditava que poderia retornar o que me foi dado na minha formação, que foi publica 90% do tempo”, explica.
Hoje, Janaína pesquisa sobre os impactos das fontes de energia renovável na rede elétrica e busca encontrar soluções para esse problema. Ao ler o tema, pode parecer algo distante e com certeza um tanto difícil de explicar, mas na verdade é uma discussão que tem ganhado força e impacta diretamente no modo de vida do consumidor.
Antes de ir para o doutorado, em 2006, Janaína conheceu, por meio de um amigo em comum, seu esposo Rodrigo. Do relacionamento de dez anos, nasceu sua filha Maria Luiza, de 5 anos, e João, de 10 meses. A rotina mudou, a professora tirou licença maternidade durante o período da pandemia e relata que foi difícil ficar afastada dos alunos e do estudo, mas agora que voltou está cheia de sonhos e ansiosa para dar vida a novos projetos. “Às vezes o meu coração pede que eu faça mais como mulher e para mulher e eu não sei nem muito bem como fazer, mas tento buscar as respostas.”
Sobre o futuro, Janaína espera uma certa naturalidade na ocupação dos espaços pela mulher. “Que a gente não precise ir lá dizer que lugar de mulher é onde ela quiser, que seja natural, que a minha filha cresça com isso natural e saiba que ela pode fazer o que ela quiser. Quero que a minha filha me veja voltando a fazer o que eu amo e que isso seja para ela e para tantas outras meninas uma forma de entender, muito natural, de que a gente faz tudo. Inclusive para os meninos também que fique muito claro que as meninas podem fazer o que elas quiserem.”