Lidiane Charbel Peres: Um olhar inovador sobre o envelhecimento

Por Elisabetta Mazocoli, sob supervisão da editora Luciane Faquini





A assistente social Lidiane Charbel Peres, 39 anos, ganhou, em 2021, o Prêmio Zilda Arns, de prestígio nacional, pelo seu trabalho de cuidado com idosos. Mas sua trajetória se destaca por muitos outros motivos: ela criou diversos projetos voltados para a qualidade de vida desse segmento da população e para o aperfeiçoamento das instituições de longa permanência. Foi representante do Conselho do Idoso e ainda vice-presidente e presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa. Lidiane saiu de São João Del Rei para Juiz de Fora obstinada a fazer a diferença e quebrar tanto seus próprios preconceitos quanto os da sociedade. Nessa trajetória, não deixou os estudos de lado, fez cursos e se especializou o quanto pôde para conseguir ajudar mais e mais pessoas. Continua assim, todos os dias, cheia de planos e de novos objetivos para conseguir trazer melhorias sociais. O trabalho não é apenas uma ocupação, é uma missão de vida, que está em primeiro plano o tempo inteiro.

Lidiane Charbel Peres, 39 anos, viveu a infância em São João Del Rei, brincando no chão de terra, participando de todos os piques de rua, sem nenhum aparelho eletrônico ao seu redor. Se dissessem, naquela época, que ela se tornaria uma assistente social e que iria receber um prêmio de prestígio nacional por seu trabalho com idosos, provavelmente não acreditaria. Mas teria certeza ao menos de uma coisa: a sua vontade de mudar vidas vinha de longe. Esse desejo sempre a acompanhou e foi o responsável por mudar não só a sua própria história, mas também a de tantos outros que foram impactados por seu trabalho.

A vontade de se tornar assistente social surgiu a partir do contato com uma professora do cursinho que iniciou quando estava no final do curso de Filosofia. Ao conhecer mais sobre a outra profissão e entender o potencial que ela oferecia de se fazer algo para atingir mais concretamente a vida dos outros, Lidiane percebeu que aquilo a envolvia muito. E de fato, ao longo de sua carreira, nunca teve medo de lidar com questões como violência, desemprego e vulnerabilidade social, coisas que poderiam fazê-la repensar a decisão.

Mas a assistente social chegou mesmo à área de que mais gostou quando estava distribuindo currículos, logo que se formou. “Recebi duas propostas e acabei optando por ir para um abrigo, o Lar de Idosos Santa Luiza de Marillac. Fiquei lá de 2011 a 2016. Nesse período, me inseri em dois espaços importantes para envelhecimento, me aprofundei muito na área e deixei pra trás diversos preconceitos”, diz.
Um desses espaços a que se refere foi o Conselho do Idoso, no qual entrou primeiro como ouvinte e depois como representante da instituição onde trabalhava. Logo depois se vinculou ao segundo espaço, o Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa, do qual foi vice-presidente e presidente. Com essas participações, fez algo que considera uma de suas maiores conquistas: uma conferência municipal dos gerentes da pessoa idosa, na qual mais de 80% do público foi formado por pessoas idosas, participando e deliberando sobre seus direitos e conquistas.

Apesar de já estar, em 2015, totalmente envolvida na área, foi nesse momento em que aconteceu um ponto de virada: surgiu o projeto Condomínio Cultural. “Foi possível mostrar que o termo asilamento estava caindo por terra. A instituição era uma residência coletiva, e os idosos deviam ser vistos como moradores do local, não como pessoas abandonadas.”

O projeto que desenvolveu realizou reuniões de condomínio; sessões de pet terapia; uma rádio Marillac, coordenada por dois idosos; um jornal de informes; o bazar da instituição; além de uma parceria com escolas, que estimulava a troca de cartas entre idosos e crianças. “Quando entro em algum local, entro para fazer a diferença”, afirma.

Superando preconceitos

Mas nem sempre Lidiane enxergou o envelhecimento da forma carinhosa e natural como vê agora. Ela, por exemplo, revela que sempre temeu o que aconteceria com seus pais. Mais que isso: uma vez, teve que escrever uma carta para o seu “eu idoso” e se imaginou com 60 ou 70 anos já precisando de andador, com todas as piores dificuldades que o envelhecimento pode trazer. “Foi uma carta péssima. Quando peguei pra ler de novo, já tinha mudado completamente minha cabeça”, relembra.

Com o tempo e a vivência de trabalho, esses seus preconceitos, tão comuns na sociedade, foram caindo por terra. “Quando você começa a estudar e a ter mais contato com esse público, você vê que a velhice não é como se imagina. Há muitos idosos com envelhecimento ativo, que não vivem com dependência. Existe um certo declínio físico, é claro, mas é algo normal, natural”, diz.

Um outro momento muito marcante do seu trabalho foi quando percebeu que uma das idosas do abrigo era curatelada, ou seja, não podia administrar seus bens e carregava consigo o estigma de incapaz, mesmo não sendo. Ela conta que aquilo impactava totalmente a mulher. Percebendo isso, entrou com um processo para suspender a curatela e, após dois anos, obteve a vitória. “O peso que deram pra ela, conseguimos retirar. Ela mudou totalmente de postura depois”, diz. Para Lidiane, então, mudar a percepção desses preconceitos, que antes até ela mesma carregava, é uma tarefa essencial.

As mulheres devem acreditar no potencial que têm e buscar fazer o que querem com comprometimento e coragem. A luta de gênero é muito desigual, e as mulheres precisam se unir para passar por todos os desafios que são impostos

Lidiane Charbel Peres

Prêmio Zilda Arns e legado

Quando foi indicada para o Prêmio Zilda Arns, em 2021, Lidiane já conhecia a honraria, que é concedida pela Câmera dos Deputados e que homenageia pessoas ou instituições que defendem a pessoa idosa. Junto com 32 outros concorrentes do Brasil inteiro, Lidiane não imaginava que poderia ganhar, e já estava muito honrada com a mera indicação.

“Quando vi que estava concorrendo com padre Júlio Lancelotti e a Karla Giacomin, achei que não ia passar nem perto”. Por isso mesmo, quando recebeu o resultado, escutou o áudio cinco vezes. Só foi acreditar que era verdade quando seu nome saiu na internet. Mas o prêmio maior, como conta, foi ver seus pais também se sentirem honrados e premiados com a conquista.

Hoje, a assistente social ainda participa, como voluntária, da Frente Nacional de Fortalecimento de Instituições de Longa Permanência para Idosos, dá aulas gratuitas nas suas redes sociais e ainda oferece cursos para formar cuidadores de idosos. Para ela, seu trabalho é como uma missão de vida e espera que seja lembrada pela sua vontade de compartilhar conhecimento e por se dedicar e fazer o melhor que pode onde quer que esteja.

Para as mulheres, deixa como recado: “devem acreditar no potencial que têm e buscar fazer o que querem com comprometimento e coragem. A luta de gênero é muito desigual, e as mulheres precisam se unir para passar por todos os desafios que são impostos”.