Viviany Anderson nasceu em Juiz de Fora e percorreu o mundo correndo e conquistando medalhas. O nome que já esteve sob os holofotes em todo país, hoje se dedica a passar a 40 crianças e adolescentes os ensinamentos que aprendeu ao longo de sua caminhada. Disciplina, coragem e força para conquistar os objetivos, para ela, é o que o esporte tem a ensinar. Não importa como seja, Vivyane sempre está em movimento, à frente de projetos sociais, disputando corridas em diferentes cidades, no ritmo agitado que herdou da mãe, sua maior inspiração. Para ela, ser uma mulher no esporte requer isso, muita energia e bravura para nunca se manter parada.
Em sua primeira corrida profissional, Viviany Anderson atravessou a linha de chegada com os pés descalços. A recordação que tem de sua primeira vitória é dolorosa. Com apenas 18 anos e sem treinamento, competiu com atletas experientes em uma maratona de 21 quilômetros da Rede Ferroviária em Juiz de Fora. “Eu comecei a corrida com tênis all-star e quando chegou no sétimo quilômetro meu calcanhar já estava sangrando, eu arranquei os sapatos e continuei descalça.” Segundo ela, os 14 km seguintes foram cansativos, “mas foi muito bacana vencer aquele desafio e subir no pódio com pessoas que já eram atletas. Eu não era atleta ainda, estava só começando”.
E de fato aquele seria apenas o primeiro de muitos pódios em sua carreira no atletismo. Viviany Anderson, hoje com 52 anos, é um grande nome do esporte juiz-forano e nacional. Viajou para 12 países e coleciona inúmeros títulos e medalhas, dentre eles, o bicampeonato na Maratona Internacional de São Paulo em 1997 e 1998. Foi a brasileira com a melhor colocação nas edições da São Silvestre de 1997 e 1998 e conquistou a medalha de bronze nos Jogos Pan-Americanos de Winnipeg, no Canadá, em 1999.
Para citar todos os títulos conquistados por Viviany seria preciso mais páginas no jornal, mas como ela bem diz, “não são as medalhas e pódios que definem uma atleta, mas a força que a motiva a nunca desistir”. Mas essa palavra, desistência, não existe em seu vocabulário. Aprendeu com a mãe, desde muito nova, a encarar de frente os desafios da vida. “Minha mãe, Elzi Taxa, é minha grande inspiração. Herdei a genética dela, uma mulher de muita fibra, sempre me apoiou. Criou os quatro filhos praticamente sozinha, mesmo com toda dificuldade, nunca deixou faltar nada para a gente.”
A atleta nasceu em Juiz de Fora em 1969, ainda criança mudou-se para São João Del Rei, onde passou a adolescência. Desde pequena era muito agitada, todos os dias brincava na rua e, claro, praticava atividade física sem nem saber que seu futuro estava justamente ali. Na escola Viviany ingressou na equipe de atletismo. “Eu tinha bons resultados, mas não imaginava seguir carreira profissional como atleta.”
Quem enxergou o potencial de Viviany foi Jefferson Vianna, professor do curso de educação física da Universidade Federal de Juiz de Fora. Após vencer a corrida da Rede Ferroviária e chegar em segundo lugar em uma competição da Polícia Militar, a agilidade de Viviany foi identificada por Jefferson, que a convidou para ingressar na equipe esportiva da Companhia Paraibuna de Metais. “A partir daí, comecei a ter um treinamento de verdade, com bons equipamentos, uma rotina regrada, foi o início da minha caminhada esportiva.”
Na década de 1990, Viviany viveu o auge de sua carreira, disputou todo o circuito de corridas nacionais e internacionais, fez o seu melhor tempo na Maratona de Berlim, em 1997, venceu competições importantes na Coreia, Hungria, Espanha, Inglaterra, entre outros países. “Hoje em dia eu ainda corro. Participo de competições regionais, que na época eu não podia competir, ficava restringida às disputas internacionais. Continuo viajando, mas dessa vez para lugares mais próximos. Semana passada, competi em uma prova no bairro da minha mãe, em São João Del Rei, e fiquei em primeiro lugar na categoria geral.”
Para ela, não há distinção entre vencer uma grande competição internacional e conquistar uma corrida de bairro. “Vencer é gostoso em qualquer lugar. Ganhei uma corridinha há pouco tempo em Lagoa Dourada, fui a primeira entre os cem competidores. Pra mim, foi muito bom, com 52 anos, ainda subir no pódio. Eu sou movida a desafios e a objetivos, se o meu objetivo era fazer o melhor em Berlim, eu fiz e fiquei feliz. Se hoje o meu objetivo é vencer uma corrida em Lagoa Dourada, se eu conseguir, vou ficar feliz da mesma forma. Não são as grandes conquistas que importam, mas as conquistas pessoais.”
A partir dos anos 2000, a atleta deu uma pausa nas competições profissionais. Com 30 anos, ainda tinha uma extensa lista de sonhos para realizar, um deles era o sonho de ser mãe. “Eu decidi dar um tempo nas competições porque eu queria muito engravidar. Logo nessa época surgiu a oportunidade de adotar a Lívia. A sobrinha da minha vizinha estava grávida e não ia ter condições de ficar com a criança. Eu sempre muito ansiosa, não tenho paciência para esperar, fiquei encantada com a possibilidade de vir uma criança prontinha para mim. Conversei com a mãe dela e, dois dias depois, a criança nasceu. Eu escolhi o nome, Lívia Anderson. É a minha filha do coração.”
Atualmente Viviany mora com Lívia, que tem 19 anos, e seus 13 cachorros, no Bairro Filgueiras. Os animais são uma de suas paixões. “Tenho muitas paixões, adoro cachorro, amo música e crianças.” A música está nos seus planos para o futuro. Influenciada pela filha, que adora tocar violão, Viviany quer ressuscitar uma parte de si que ficou perdida durante a vida adulta. “Quando eu era criança e morava em São João Del Rei participei do conservatório de música da cidade. Tocava flauta. Sempre tive um ouvido muito bom para música e pretendo voltar a tocar, quero aprender o violão.
"Uma vez deu polêmica aqui na cidade, eu me recusei a subir no pódio porque eles não iriam dar o valor todo do prêmio se uma mulher ganhasse. Foi minha forma de reivindicar a premiação igual para homens e mulheres. Do mesmo jeito que eu me esforço, que eu treino, eles também treinam, o meu tênis é do mesmo preço que tênis deles, não faz sentido ter essa diferença. A gente sabe que ser mulher é difícil, em qualquer área, não só no esporte, mas o meu jeito de lidar com essa dificuldade foi nunca me calar, e acho que deu muito certo, ainda está dando"
Paralelamente à carreira de atleta, Viviany coordena projetos sociais com crianças e adolescentes de Juiz de Fora para promover a inserção no esporte. O trabalho com crianças acontece há 24 anos. “Em todo bairro que morei, eu puxava uma galerinha para ir treinar comigo. Crianças e adolescente dali mesmo. A gente formava um grupo e ia correr.”
Em 1992, depois de competir em provas na Inglaterra, as crianças da cidade passaram a ver em Viviany uma inspiração. “Elas falavam que queriam ser igual a mim, para poder viajar e competir em lugares distantes. Mas uma coisa que eu sempre cobrei foi a disciplina.”
Os primeiros projetos começaram em parceria com a Associação Municipal de Apoio Comunitário, onde Vivyane passou a treinar com crianças e adolescentes de alta e média complexidade. “Na época, meu treinador ficava bravo, ele dizia: ‘você tem que focar, você é atleta, não treinadora’. Mas eu me apaixonei por esse trabalho, eu sabia que seria melhor treinadora do que atleta e já se vão anos nesse caminho.”
A atleta fundou a Associação Atlética Viviany Anderson do qual faz parte o projeto Ligeirinhos, que atende mais de 40 crianças e adolescentes no Bairro Filgueiras. “O projeto vai fazer seis anos e atende as crianças do bairro três vezes por semana. Um dia temos o atendimento psicológico e, nos outros dois dias, é de corrida e recreação.”
Para vencer as adversidades de ser uma mulher do esporte, Viviany conta que precisou seguir o exemplo de sua mãe, que nunca se calou. “Sempre fui muito malcriada. Já vivi situações onde eu estava correndo e falaram ‘magrela, não vai correr não, vai lavar um tanque de roupa’, e eu nunca abaixei a cabeça, sempre respondia.” Ela conta que participou de competições onde o valor do prêmio era diferente para homens e mulheres, no qual as mulheres receberiam a metade da premiação.
“Uma vez deu polêmica aqui na cidade, eu me recusei a subir no pódio porque eles não iriam dar o valor todo do prêmio se uma mulher ganhasse. Foi minha forma de reivindicar a premiação igual para homens e mulheres. Do mesmo jeito que eu me esforço, que eu treino, eles também treinam, o meu tênis é do mesmo preço que tênis deles, não faz sentido ter essa diferença. A gente sabe que ser mulher é difícil, em qualquer área, não só no esporte, mas o meu jeito de lidar com essa dificuldade foi nunca me calar e acho que deu muito certo, ainda está dando”